judiciário

Servidoras do Tribunal de Justiça são denunciadas por racismo religioso

26 de agosto de 2024 às 18h06 Por Wallison Bezerra

O Ministério Público da Paraíba (MPPB) ofereceu denúncia contra três servidoras do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) pela prática de racismo religioso, previsto no artigo 20 da Lei 7.716/1989 combinado com o artigo 71 do Código Penal. A Ação Penal tramita na 4ª Vara Criminal da Capital e foi proposta pelo promotor de Justiça Arlan Costa Barbosa.

Foram denunciadas criminalmente as servidoras do Setor Psicossocial do Fórum Cível da Capital, Ana Valquíria Perouse Pontes, Suênia Costa Cavalcanti e Rosângela de França Teófilo Guimarães. As três são acusadas de terem praticado, nos anos de 2015 e 2016, discriminação e preconceito contra uma mulher de religião de matriz africana, que era parte de um processo que tramitava na 2ª Vara de Família de Mangabeira. De acordo com a vítima, as servidoras chegaram a sugerir que ela poderia perder a guarda dos filhos em razão de sua fé, o candomblé.

A denúncia é um desdobramento do Inquérito Policial 0810775-21.2024.8.15.2002, instaurado a pedido da promotora de Justiça da Capital, Fabiana Lobo, que atua na defesa da cidadania e do Núcleo de Gênero, Diversidade e Igualdade Racial (Gedir/MPPB). Os órgãos ministeriais tomaram conhecimento do caso, este ano, a partir de ofício encaminhado pela Coordenação do Núcleo de Apoio das Equipes Multidisciplinares do TJPB (saiba mais).

Conforme explicou o promotor de Justiça Arlan Barbosa, que assina a ação penal, o crime de racismo religioso é imprescritível, e, apesar de a pena mínima prevista na lei ser inferior a quatro anos, o MPPB decidiu não oferecer acordo de não persecução penal (ANPP), previsto no Código de Processo Penal, por entender que a medida não seria suficiente para a reprovação e repressão do delito. “Existe, inclusive, uma Nota Técnica do Centro de Apoio Operacional em matéria criminal do MPPB nesse sentido e decisão do Supremo Tribunal Federal (RHC 222.599) no sentido de ‘que o alcance material do ANPP não deve abarcar os crimes raciais’”, argumentou.

Racismo religioso

De acordo com a investigação policial, a vítima é iniciada no Candomblé, religião que segue desde criança, e, em 2015, precisou ajuizar ação de regulamentação de visitas dos filhos menores, à época. No âmbito da ação, foi determinada a avaliação do setor psicossocial do TJPB, localizado no Fórum Cível, e ficou acordado acerca dos dias em que a mulher deveria levar as crianças ao setor, para que o genitor as visitasse.

A investigação revela que, durante esse período (que durou de dois a três anos), a mulher sofreu racismo religioso por parte das denunciadas, que, a todo o tempo, questionavam a sua religião e diziam que ela não deveria levar os filhos para “terreiro de candomblé”, porque o local não era adequado para crianças, tinha bebidas e era habitado por homossexuais e travestis, dentre outras afirmações preconceituosas e discriminatórias.

A vítima relatou à autoridade policial e ao MPPB, episódio em que chegou a ouvir Suênia dizer às demais denunciadas: “chegou a macumbeira”, referindo-se a ela.

De acordo com a denúncia, em outra ocasião, a servidora teria impedido a vítima de entrar na sala do fórum por estar vestida com os trajes do candomblé. “Após este ocorrido, a vítima passou a não usar mais seus trajes característicos da religião que pratica e, ao chegar ao Fórum, recebeu das acusadas comentários como: ‘gostei de ver, você está direitinha, está entrando nos eixos’. Em outros momentos, a denunciadas chegaram a zombar de alguns rituais próprios de sua religião, como o banho de pipoca, e diziam que só havia um Deus e que ela deveria levar seus filhos para uma igreja católica ou evangélica. A vítima afirmou que sofreu tanto, durante esses anos, que chegou a mentir para as servidoras, dizendo que não frequentava mais os terreiros e que fechara a casa de santo, para que elas parassem, pois até mesmo suas crianças não queriam mais ir para as visitas no Fórum”, explicou o promotor de Justiça.

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